Vamos deixar o mato crescer.deixar quem queira voltar pra lá

Dias atrás encontrei uma formiga onça
Dona Delí tinha dito que se costurasse uma num pano
ela ainda vivinha, se fazia um patuá.
Ela ia morder doído até morrer
mas nada mais de mau me ia acontecer.
Nem doença, nem mau olhado...nada.
Peguei.
Bonita. Grande com suas pintas amarelas.
Olhei...fiz o pedido.
Ela disse que não era hora. Soltei.
Todos temos que morrer
quando chegar a nossa hora.
Aqui em Araraquara, na região toda, quase tudo é cana
Latifúndio. Terra boa que não acaba mais.
Ainda tem uns restos de mata velha
onde amontoam o que sobrou dos bichos e plantas
num bocadinho, assim, de terra.
Superpopulação irônica
pensei no humano. As cidades.
Primeiro fazem com que o povo do mato saia de suas casas
dizendo que a terra não é mais deles...
deles os próprios filhos da terra
que o dinheiro vale mais
que a terra é de quem tem o papel assinado.
Gente de fora. Graudão
aí soltam gados em suas hortas
cortam suas matas
matam os seus bichos
e dizem que o serviço que inventaram acabou
e o povo custa caro:
“- Na cidade tem mais chance”
mandam o povo pra cidade
e ainda dizem que eles vão por ganância.
Na cidade nascem os filhos
sempre lembrando das histórias dos antigos.
É...porque se tem uma coisa que não é esquecida
é isso do tempo da felicidade...
do rio limpo...da comida limpa...
dos segredos do dia e da noite.
Pois não é que os graudão
dizem que o mundo é superlotado...
Que não vai ter mais espaço,
que as pessoas não podem mais nascer...
que vão ter que fazer casa na lua.
Só pra se ganhar mais dinheiro?
Só que tem muita terra, gente!
Terra onde mora um mundão de cana,
de boi, de café, de laranja, de soja.
Que as pessoas nem comem tudo.
É só prá tomar lugar do povo.
Ô meu Deus, deixa esse povo que era da terra voltá pra terra.
Se a gente veio do pó deixa a gente voltá pro pó!
Deixa as árvores crescerem pros bichos poderem morar
e cuidar dos seus filhos
e a água derramá de tanta quantidade.
Gente, pára de pensar na ganância
vamos pensar nos filhos dos nossos filhos.

déco
Araraquara 02-07-99
(parte da poesia inspirada no jeito de declamar poesia regional dos grandes declamadores Osvaldo Matsuda e Julio Cesar Costa)
(do Livro Vento Caminhador)

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