Sempre
tive pelos sebos uma paixão profunda. Percorrer as prateleiras abarrotadas de
livros de todas as épocas enche-me o espírito de prazerosa satisfação.
Garimpando entre um e outro sempre encontro algo importante, e a preço módico,
o que é mais interessante. Anos atrás, num sebo da Praça Mauá, em Santos,
encontrei livros raros, pelos quais paguei uma ninharia, entre eles, as “Obras Completas” de Paulo Setúbal, editadas na década de 1950, e “As Farpas”, de Éça de Queirós, edição de 1926.
Num outro
sebo, mais chique, no Gonzaga, encontrei “Poemas
e Canções”, edição de 1934, de Vicente de Carvalho, um de meus poetas
preferidos. Para quem não sabe, Vicente de Carvalho, poeta parnasiano de fina
inspiração, sempre teve estreitos laços com o Vale do Ribeira. Era sócio da
Companhia de Navegação Fluvial Sul Paulista, que durante décadas foi
responsável pela navegação fluvial em nossa região. Criou alguns dos mais belos
poemas de nossa língua.
Em
Iguape, costumava frequentar um sebo instalado numa banca detrás da Basílica do
Bom Jesus, onde sempre encontrava muitos livros antigos e, de lambuja, ganhava
alguns de brinde. Ali comprei “As
Aventuras de Pickwick”, de Dickens, “As
Ilhas da Corrente”, de Hemingway, “A
Religiosa”, de Diderot, “Os
Sofrimentos do Jovem Werther”, de
Goethe, “A Morte de Artêmio Cruz”, de
Carlos Fuentes, “Os Irmãos Karamazovi,
de Dostoiévski, entre outros.
O dono do sebo,
amante inveterado dos livros, sempre me ofertava alguns livros antigos, que
para outros talvez tenham pouco valor, mas que para mim, apaixonado por livros
antigos, são como que preciosidades: “O
Paraíso”, de Coelho Neto, edição de 1926, “A Musa em Férias”, de Guerra Junqueiro, de 1923, “Flor d’Alisa”, de Lamartine, de 1924, “A Marquezinha de Seiglière”, de Jules
Sandeau, de 1934, e assim por diante.
Com seu jeito
simples, o meu amigo contava histórias sobre cada livro, e até mesmo sobre
autores que conheceu pessoalmente, como o poeta Glauco Mattoso, entre outros.
Ou sobre aquela edição original de “Grandes
Sertões: Veredas”, com o autógrafo de Guimarães Rosa, que vendeu, por
engano, a um esperto comprador, a preço de banana.
Um
de meus prazeres mais acalentados não é a leitura propriamente dita, mas o ato
de folhear as páginas dos livros, senti-los em toda sua plenitude, procurar
decifrar seus mistérios, para depois, aí sim, ler com avidez as suas páginas. E
foi com surpresa que, ao folhear “A Musa
em Férias”, do grande poeta português Guerra Junqueiro, logo nas primeiras
páginas, li a dedicatória que o autor fez ao seu amigo Bernardino Machado, que
foi presidente de Portugal por duas vezes. Nascido em Iguape, onde seu pai era
vice-cônsul português, Bernardino Machado cedo partiu com sua família para
Portugal, onde se notabilizou como um dos mais ilustres homens de seu tempo.
Por ROBERTO FORTES
(Publicado no JORNAL REGIONAL, nº 1.061, 14-11-2013)