MISANTROPIA
Eu tinha uma fisionomia mansa, mansa,
Quando eu era criança!..
E tinha uma alma boa, boa,
Que se comovia à toa!...
E tinha um coração afetuoso, afetuoso;
Estupidamente carinhoso!...
E tinha muito medo, muito medo,
Vendo em tudo um mistério e um segredo...
Hoje tenho a fisionomia entristecida
Pela experiência da vida;
E a alma cheia de mágoa
E os olhos cheios d’água...
E tenho o coração amargurado, cortado,
Pelos segredos revelados.
Pelos mistérios desvendados...
E vejo que o que era medo é covardia...
- Falta de fé, falta de luz, falta de guia, -
E sinto que me faz um pavoroso mal
Ver que é minoria a porcentagem de homens
Que vivem em sentido vertical...
Xiririca, 1933
DOMINGOS BAUER
O RIBEIRA DE IGUAPE
Prainha, sábado, 10 de fevereiro de 1934 - ANO I - Nº 2
DUAS ALMAS
Oh! Tu que vens do longe, oh! Tu que vens cansada
Entra, e sob o meu teto encontrarás carinho...
Eu nunca fui amado e vivo tão sozinho.
Vives sozinha sempre e nunca foste amada...
A neve anda a branquear lividamente a estrada,
E a minha alcova tem a tepidez de um ninho.
Entra ao menos até que as curvas do caminho
Se dourem no esplendor nascente da alvorada
E amanhã, quando a luz do sol dourar vaidosa
Essa estrada sem fim deserta, horrenda e nua,
Podes partir de novo, ó nômade formosa!
Já não serei tão só, nem serás tão sozinha;
Há de ficar comigo uma saudade tua...
Hás de levar contigo uma saudade minha...
ERNESTO GONÇALVES SILVA
(Delegado de Polícia)
O RIBEIRA DE IGUAPE
Prainha, domingo, 11 de março de 1934 - ANO I - Nº 4
DESPEDIDA
Vou como a barca que sai barra à fora,
Cujo barqueiro, sem contar com a vida,
Toda a esperança de uma vez perdida,
Cortando as ondas, calmo, vai-se embora.
Adeus torrão, que vou partir agora!
E sabe Deus dessa cruel partida!
Levo minha alma toda estremecida
Da dor profunda que já vem de outrora.
Ao naufragar no mar de minha lida,
A meu Jesus, com fé, recorrerei.
E se não der para escapar com vida,
Ao meu torrão jamais eu voltarei...
Pór isso eu digo a ti, ó flor querida,
Um triste adeus... até quando? Não sei...
Xiririca, 1934
JOÃO
RIBEIRO DE FREITAS
O RIBEIRA DE IGUAPE
Prainha, domingo, 1º de julho de 1934
ROSA BRANCA
Sonho ou quimera, na ilusão divina
Que o mundo alado o coração transporta,
Aquela rosa pálida e franzina,
Branca, tão branca, parecia morta...
Planta que o frio da existência inclina,
Pomba que foge ao seu país...Que importa?
Sonho ou quimera, na ilusão divina,
Branca, tão branca, parecia morta...
Mesmo acordado ou vendo-a com tristeza
Nas molduras do sonho e da incerteza,
Que a fantasia em pleno azul recorta,
Sempre na imensa dor que me fulmina,
Aquela rosa pálida e franzina,
Branca, tão branca, parecia morta...
ANTONIO FEIJÓ
TRIBUNA DE IGUAPE
Iguape, domingo, 2 de abril de 1916 - ANNO IV - Nº 62
SONHEI
Que sugestionado pelo amor inexorável,
Deixei a terra e subi às regiões etéreas;
E penetrando no palácio admirável,
Encontrei quadros de fadas e quimeras:
Minerva. Apolo contemplavam sua ermida.
Júpiter no seu adito resplandecente
Era austero, de coragem estimada e
Dominava todos com olhar persistente.
No centro do palácio estava uma poltrona
Estufada de fina seda e áurea lã;
Assentado, como um herói de maratona,
Achava-se o rei místico, o poderoso Pan.
Eu, atrasado peregrino aí chegado
Duma região vil e cheia de impurezas,
Tornei-me oculto num esconderijo sossegado
Pra melhor apreciar tão excelsas belezas.
Tudo era belo, encantador e santo;
O ambiente do palácio empírico
Era de extasiante perfume, e tanto
Que eu fiquei em estado letárgico!
Quando voltei deste passeio espiritual
A minha hipoerástica residência,
Hipocondria profunda e desgosto mortal
Avassalou-me a própria consciência!
Neste ingrato mundo, templo de expiação,
Onde se debate a louca humanidade
Em busca do ouro sem lembrar-se da salvação,
Na vida futura, na Eternidade.
S. Paulo de 1901
HUGO RIBEIRO
CIDADE DE XIRIRICA
Xiririca,quarta-feira,20 de março de 1901-ANNO I- Nº 07
SONETO
Se tu soubesses como és querida
- Oh! Bela fada de sonhos!
Por uma alma embevecida
Pelos teus gestos risonhos!
Se tu pudesses compreender
Toda a imensa adoração
Que, à tua vista, se embeber
Foi no meu virgem coração!
Talvez tivestes compaixão
De quem não tem mais coração,
O qual te foi todo entregado!
Talvez volverás, ó formosa,
Alguma vista piedosa
A este pobre desgraçado!
S. Paulo, 20 de novembro de 1900
GODOFREDO RIBEIRO
CIDADE DE XIRIRICA
Xiririca, domingo, 23 de abril de 1901 -ANNO I - Nº 11
SO’S
Deixemos pó, rumor, luxo das cidades;
Ninguém saiba onde eu moro, onde tu moras;
No campo, longe, unindo as nossas horas.
Unam-se as nossas duas mocidades.
Nossa paixão tem loucas ebriedades,
Cantos, que em si contém nascer de auroras,
Que em si ruflam canções de asa sonoras
E idílios cheios de mortalidades.
O nosso amor é simplesmente humano:
Dura um instante, ou dois, um dia, um ano;
Pode ainda durar a vida inteira...
De nossa alma amorosa essência pura,
Quem sabe o tempo que uma essência dura,
E o tempo que ainda o frasco exausto cheira?
LUIZ DELFINO
“O MIRACATU”
Domingo, 19 de junho de 1949 - ANO V - Nº 232
JUQUIÁ
ONTEM E HOJE
(O rio divide a cidade em duas partes distintas)
Um rancho de sapê surgiu primeiro
E depois outros, sempre num crescente!
Querendo evoluir aquela gente,
Já parecendo humano formigueiro!
Cultiva a terra aqui audaz roceiro,
Derruba a mata o lavrador valente!
E tendo todos um pensar somente:
“Róseo futuro nos virá lampeiro!
Do que foi ontem diferente agora,
Vive hoje sobre si, a gente mora
Num lindo casario branco e novo!
Nesta verdade Juquiá se encerra:
Divide o rio a dadivosa terra
Mas não divide o coração de povo!
Rio de Janeiro, 6 de março de 1949
TUCAMIRA
“ O MIRACATU “
Miracatu, 20 de março de 1949 - ANO V - Nº 219
ADEUS
(Elevado à categoria de Município, desmembrado de Miracatu)
Embora longe do bulieio enorme,
Balício trepidante da Cidade!
Aonde e sempre, sem cessar invade
Vigilante o progresso que não dorme!
Pondo de lado o que supõe disforme,
Que fica do Passado na Saudade!
Olhando para a frente, eis a verdade,
Seguir da Evolução o que é conforme!
Juquiá cumprindo a majestosa lei,
Crescer querendo diz: me emancipei,
Meu gesto ingrato imploro que não tome!
Miracatu, bondosa Mãe, escuta,
Agora, do Progresso, eu vou pra luta,
Adeus! Querida, eu honrarei teu nome!
Rio de Janeiro, 6 de março de 1949
TUCAMIRA
“O MIRACATU”
Domingo, 20 de março de 1949 - ANO V - Nº 219
Poema escrito no carro bufett da Santos - Juquiá
PAISAGEM
Dorme sob o silêncio o parque. Com descanso,
aos haustos, aspirando o finíssimo extrato
que evapora a verdura e que deleita o olfato,
pelas alas sem fim das árvores avanço.
Ao fundo do pomar, entre as folhas abstrato,
em cismas, tristemente, um alvíssimo ganso
escorrega de manso, escorrega de manso
pelo claro cristal do límpido regato.
Nenhuma ave sequer sobre a macia alfombra
pousa. Tudo deserto. Aos poucos, escurece
a campina, a rechã sob a noturna sombra.
E enquanto o ganso vai, abstrato em cismas, pelas
selvas a dentro entrando, a noite desce, desce...
e espalham-se no céu camândulas de estrelas.
FRANCISCA JÚLIA
“O MIRACATU”
Domingo, 24 de fevereiro de 1946 – ANO II – Nº 60
ESTER
Enviada pelo tio, Ester sobe fremente
Os ebúrneos degraus do trono de Assuerro.
- “Senhor”, diz ela ao rei, “perdoa-me se quero pedir
que tenhas dó de minha pobre gente,
esse pérfido Aman, que julgas tão sincero,
quando acusa os judeus, procede injustamente,
não creias no que diz, pois teu ministro mente,
em nome de Jeová, Senhor, eu te assevero!”
Com o peito ofegante e a palidez na face,
Ester, não se contendo, em lágrimas desfaz-se,
ao vê-la assim tão bela, o velho rei então,
nos seus braços a toma e, com ternura infinida,
dá-lhe tudo o que pede e alguma coisa ainda
de muito mais valor – seu próprio coração!
J. SCHWENCK
(Médico do Posto de Saúde)
“ O MIRACATU”
Miracatu, 11 de março de 1951 – ANO VII – Nº 322
OLHOS NEGROS
Olhos negros de tratos sedutores,
A paz roubastes desta triste vida;
Só vivo pensando em vós, que tão traidores,
Abristes neste peito uma ferida.
Sonhei-vos esta noite, lacrimantes,
Olhos de um fogo ardente,,,feiticeiros;
Por que vos condoestes? Vacilantes
Pousastes sobre mim, mas não fagueiros.
Resignados então e arrependidos,
Volvestes para mim, para o meu lado...
Talvez pelo remorso perseguidos,
De terdes este amor menosprezado.
.....................................
.............................
Depôs de um leve sono, despertando,
Do pobre quarto meu, abro a janela
E a luz de prata vai-se declinando,
Da lua cheia encantadora e bela...
Foi sonho, bem o sei, foi fantasia!...
Mas quem me dera fosse verdadeiro...
O que no meu quartinho reluzia,
Já não se encontra mais no mundo inteiro!...
A. TAVOLARO
“O PRAINHENSE”
Prainha, agosto de 1917 – ANNO I – Nº 8
UM SONHO
Eis aqui, donzela, uma prova do
amor verdadeiro que te consagro...
Sonhei-te, donzela, vestida de branco,
Com cauda, grinalda, com flores, com véu;
E vi-te donzela, de braço com outro,
Quais belos anjinhos que sobem ao céu.
Sonhei-te, donzela, que estavas unida
Nos laços divinos do teu santo amor;
Que tu me cravares com força, no peito,
Punhal afiado, que d’um traidor.
Sonhei-te, donzela, que tu já dormias
Cercada de luz e de amor festival;
E que tu dizias, baixinho, baixinho,
O nome perjuro do infame rival.
Meu Deus – Oh! Que anseio senti nessa noite!
Que sonho perverso, que pura ilusão!
E ainda no peito eu tenho gravado
Os vivos sinais dessa alucinação...
S. Paulo, 1898.
NELSON C. DA SILVA BRAGA.
“ A LYRA”
Iguape, 15 de novembro de 1899 – ANNO II – Nº 8
ANJO
-Ai! Que vale a vingança, pobre amigo,
Se na vingança a honra não se lava?...
O sangue é rubro, a virgindade é branca,
O sangue aumenta de vergonha a cava.
Se nós formos somente desgraçados,
Para que miseráveis nos fazemos?
Deportados da terra assim perdemos
De além da campa as regiões sem termos...
Ai! Não manches no crime a tua vida,
Meu irmão, meu amigo, meu esposo!...
Seria negro o amor de uma perdida
Nos braços a sorrir, de um criminoso!...
CASTRO ALVES
“O IGUAPE”
Iguape, terça- feira, 14 de fevereiro de 1928 – ANNO IV – Nº 152
O PEQUENO JORNAL
Sempre que abro e releio o livro do passado,
Aos meus olhos avulta um pequeno jornal.
Modesto e sem clichês, feio e mal paginado,
- Folha do interior, simples, dominical,,,
Nunca teve, por certo, um número esgotado,
(Liam-no tão somente os filhos do local)
Tratava de “excelência” o juiz e o delegado,
E abria com um soneto a “Crônica Social”.
Apesar de modesto, é com enorme saudade
Que dele me recordo e também da cidade
Pequenina e longínqua onde, há tempos, nasceu...
Ruas sem movimento... À escola...Uma igrejinha...
A farmácia da esquina... A cidade era a minha,
A mais linda do mundo! E o soneto...era meu!
NÓBREGA DE SIQUEIRA
“O MIRACATU”
Miracatu, Domingo, 16 de janeiro de 1949 – ANO V
–Nº 210
IMAGEM
Estive contigo, e, a saída, vieste acompanhar-me,
querida.
Parti. Fazia luar.
A’ entrada da casa
ficaste a cismar.
E eu, em me afastando,
voltava-me de quando em quando,
para, contemplando-te,
aliviar minha dor.
Dentro de minha alma,
à entrada de meu coração,
por toda a noite em calma,
Vela a saudade.
Tua silhueta branca na porta
batida pelo luar,
é a imagem da saudade,
da amargura infinda
que sinto ao te deixar
minha deidade linda.
(Menestrel Prainhense)
“O MUNICÍPIO” – Prainha, 15 de novembro de 1941 –
ANO II – Num. 3.4
NAQUELA NOITE...
Naquela noite... Nós dois a sós...
Ainda lembro o que prometi:
Minha primeira jura de amor,
amor eterno que eu votaria por ti, ó Flor,
por ti!
Naquela noite...Recordações
vem agitar-me agora aqui.
Meu coração põe-se aos saltos por sentir
saudades inumeráveis de ti, ó Flor,
de ti!
Naquela noite...Eu, meditando
na ultima vez em que te vi,
quando partias daqui amor,
saudoso envio-te os meu saudares a ti,
ó flor,
a ti!
(Vate Prainhense)
“ O MUNICÍPIO “ – Prainha, 25 de dezembro de 1941
ANO II – Num. 5
A UM POETA
Admiro o poeta, por que amo a Natureza;
Adoro os versos, - como o céu cheio de estrelas;
Ou como um nome de mulher em lenda triste,
Que o gênio bom do Amor envolvesse de idílios...
Como a altura e a luz dos astros;
Como a brancura dos lírios
Eretos, mudos, e castos...
Como os murmúrios mansos, envolventes,
Que a voz do vento espalha nas matas virentes!...
Admiro o poeta, adoro os versos, porque:-
Poeta, - a tua frase, é o acorde da alvorada
Da tua lira peregrina!
Teu amor é a poesia que te rouba o sono!
Tua lágrima é a estrela matutina,
Que reluz mesmo na glória do abandono!...
Poeta, - a tua vingança é feita de perdão,
Porque sabes sofrer, sabes amar;
E porque tens um grande coração
Que, ensinando a sorrir, vive sempre a chorar!...
Xiririca- Itaúna, 1941 --AURA MARI
“ O MUNICÍPIO “ – Prainha, 25 de janeiro de
1942 – ANO II – Num. 6
CARNAVAL NA ROÇA
Não tenho lança-perfumes, nem serpentinas,
Confetes, luzes, enfeites brilhantes - cores
berrantes para o meu triste carnaval
Dias de alucinações - tão diferente –
A canção carnavalesca, que canta meu coração
Só eu a tenho decorada – E’ um grito de paixão.
Minha fantasia de triste combinação,
São cores apagadas, cópia da desilusão.
O meu salão iluminado, é um pobre barracão,
Onde Pierrot apaixonado, todo enfeitado,
De olhos amendoados, dedilha o violão.
Colombina, loirinha catita, cheia de fitas
Arrastando as chinelas com vestido de chita,
Cantando, gritando, sapateando no chão.
Itaúna, 15-2-1942 --- AURA MARI
“O MUNICÍPIO” – Prainha, 15 de março de
1942 – ANO II – Num. 7-8
CARTA A’S VE’SPERAS DE MAIO
Caro Isidoro,
...estás de Maio à espera.
É o mês marial de evocações. Momento...
Sem o encanto europeu da primavera,
Faz de astros florescer o firmamento.
Maio dá às almas misterioso ungüento,
Que embalsama, que ablue, que retempora.
A’ Virgem, pois no altar do pensamento
As brancas preces de expressão sincera!
Ave-Maria...É o ciciar que zarpa
Da terra ao céu. E à virgem rendo na harpa
Este humílimo pleito do meu nada.
E agora...dou-te o adeus que me comove
Primo Vieira – Abril de trinta e nove.
Seminário Central da Imaculada.-
Padre Primo Vieira
“ O MIRACATU “ – Miracatu, 28 de abril de 1946ANO II – Num. 69
RESPOSTA
Amigo primo,
Maio aqui desperta
Entremostrando, ciumento, apenas,
As pétalas dos dias tão amenas:
Maio tem a corola entreaberta.
E já suas manhãs – doces camenas –
Exalam preces. Nossa mente alerta
Ergue dos céus orações breves, serenas.
Aqui, amigo, Maio mal desperta.
Suas noites, porém, claras, pejadas
De luar, desabrocham alvoradas
De prata, à noite, no céu todo preto.
.......................................................................
Já que me veio em poesia à carta,
É necessário que em resposta parta
Este meu simulacro de soneto.
IZIDORO DE JESUS LEITE
“ O MIRACATU “ – Miracatu, 05 de maio de 1946
ANO II – Num. 70
O VENTO DO INFORTÚNIO
Que ventania hoje em Campos do Jordão
Qual a causa não sei de tanta ventania,
Nem de ser a razão.
Balança que balança com rajada fria
Dos pinheirais a copa imensa de verdura!
Sacode que sacode as árvores diversas
E o fruto cai no chão! As folhas no ar dispersas
Cumprem o seu destino ao léu da ventania,
Fazendo acrobacias...
E a ventania corria o nosso peito enxague!
Os nossos corações mais apressados batem.
E dentro dos pulmões os bacilos combatem
A força derradeira... a última energia...
Tosse que tosse e escarra sangue um doente;
Tem a queimar-lhe o corpo a febre treda e ar-
dente,
Desvaira o pensamento em triste conjuntura;
Sete palmos no chão,,, abre-se a sepultura!
E o doente já não tosse... o ar vai-lhe faltando
Quer falar mas não pode...a morte o está ma-
tando!
E o vento do infortúnio ainda sopra mais forte,
No instante decisivo e trágico da morte...
Enfim, já compreendi a razão
Da ventania hoje em Campos do Jordão!
Fevereiro de 1935
BENJAMIN CONSTANT DE ALMEIDA NETO
“ O MIRACATU “ -Miracatu, 17 de março de 1946
ANO II - Num. 63
ÁRVORE VELHA
Árvore velha do velho Diogo
Que sobrevive à intempérie e ao fogo
Quase sem folhas, sem flor, sem ninhos!
Seus grossos galhos estão marcados
Com monogramas de namorados
Que já morreram ou são velhinhos...
Árvore velha cheia de sonhos,
Quando e a vejo, de olhos tristonhos,
Temo que venha a ficar assim:-
Sem entusiasmos, envelhecido,
Triste, cansado, desiludido,
Sem ter, na vida, ninguém por mim...
DOMINGOS BAUER LEITE
“ O MIRACATU “ – 04 agosto de 1946
ANO II – Num. 83
SINFONIA EM AZUL MAIOR
( DE UM POEMA DE AMOR)
Como é de costume de quem sofre ou de quem ama,
Ontem à noite, após a chuva, andei ao léu;
Parei a contemplar, lá no fundo da lama,
A única estrela então que brilhava no céu.
Para, no alto do céu onde se engasta, vê-la,
Algum tempo depois os meus olhos ergui;
E olhando aquela lama, e olhando aquela estrela,
Pensei, humilde em mim, pensei vaidoso, em ti.
JULIO CESAR DA SILVA
“ O MIRACATU “ – Miracatu, 25 de agosto de 1946
ANO II – Num. 86
O CORVO
Sustendo-se nas asas, no ar passeia
O corvo, essa ave esguia e denegrida,
Que vive apenas da desgraça alheia,
Chorando o vivo que prolonga a vida...
Quando fareja a carne corrompida,
Entre a nuvens, ansioso ele volteia
E em caramujo faz a sua descida,
Em direção ao miasma que o norteia...
Vai procriar na sébes recatadas
Através das montanhas afastadas
Onde nenhum olhar lhe atinja o ninho.
Não gosta de exibir o seu produto,
Porque ele é negro, negro como o luto,
E os filhotes são alvos como arminho.
JOÃO RIBEIRO DE FREITAS
(Xiririca)
“ O MIRACATU “ – Miracatu, 06 de outubro de 1946
ANO II – Num.92
BEM SUPREMO
A mulher tudo suplanta;
No berço – é floco de espuma;
Menina - é mistério e bruma;
Moça -é pássaro, canta.
Filha – o sorriso que encanta;
Noiva – é a flor que perfuma.
Esposa -é a graça que espuma
E mãe – a graça de santa.
Mãe, ou noiva, esposa ou filha,
A MULHER é estrela que brilha
Dentro em nós como um troféu.
Honremos, pois, a nossa estrela
Porque depois que Deus fê-la
Foi que viu que fez o céu.
BELMIRO BRAGA
“ O MIRACATU “ – Miracatu, 10 de junho de 1945
ANO I – NUM. 23
“CANÇÃO RETROSPECTIVA”
Já tarde pela insistência da vida,
Sem ritmos na primavera florida,
Como uma flor em canteiro adormecido
Que surrada pelo vento caísse estremecida...
Quantas belezas estampadas na mocidade!
Quantos céus estrelados! Tardes de saudade!
Manhãs sorridentes! Gorjeio alacridade
Príncipes encantados! Trono da felicidade!...
Dos meus dias lindos de esperança:
Nas minhas travessuras de criança,
Fazia da vida uma boneca de massa
E do destino um palhaço sem graça.
Hoje, se minha pobre musa lembra aqueles dias,
Vê fases que se apagam pelas folhas vazias
E, triste o coração me diz:
Que foi aquela quadra mais feliz.
AURA MARI
“ O MIRACATU “ – 10 de março de 1946
ANO II – Num. 62
CIGARRA
Cigarra! A que está a saudar
Com teu misterioso cantar?
A mim, que vivo chorando,
Ou, no céu, as estrelas que estão brilhando?
Cigarra...Sentinela da solidão!
Ouve... que além, na estrada te repetirão!
Sossega, dorme no perfume que te embala,
Ou vem cantar a janela da minha sala.
Gosto de ouvir-te brejeira,
feiticeira,
Rasgando a túnica do luar,
A cantar... Sempre a cantar...
AURA MARI
“ O MIRACATU “ – Miracatu, 04 de março de 1945
ANO I – Num. 9
A UMA SANTA
Foge, sem ódio, ao mal: o bem pratica;
se a dor lhe dói, cuida-a gostosa e boa,
ou faz então com que ela lhe não doa,
na pobreza em que está, julga-se rica.
O mal sabe que passa; o bem, que fica;
por isso o bem acolhe e o mal perdoa,
quanto mais vive, mais se aperfeiçoa;
quanto mais sofre, mais se glorifica.
Por essa alta moral os atos regra;
em nenhum outro esforço em vão se cansa,
por nenhum outro ideal se bate em vão.
E é feliz, mais feliz por que se alegra,
não com o pouco que a sua mão alcança,
porém, com o pouco que já tem na mão.
FRANCISCA JULIA DA SILVA
“ O MIRACATU “ – Miracatu, 05 de agosto de 1945
ANO I – Num. 31
TUDO É VAIDADE
A alma do homem se torna egoísta e má
Porque a impiedade de hoje é a sua escola.
Essa que no Evangelho se acrisola,
Caridade Cristã, onde é que está?
Capazes hoje em dia, poucos há
Dessa piedade rara, que consola,
Que os olhos fecha para dar a esmola,
Afim de que não veja a quem dá.
Sede piedosos. Bem-aventurados
Os que fazem o bem de olhos fechados.
Pois a esmola é só útil e eficaz.
Só tem justo valor sem dano ou perda,
Se não chega a saber a mão esquerda,
O benefício que a direita faz.
FRANCISCA JULIA DA SILVA
“ O MIRACATU “ – Miracatu, 15 de abril de 1945
ANO I - Num. 15
SEM CORAÇÃO
( À Srta. Yvone de Oliveira)
Não sentes palpitar no peito vazio
Isso a que o poeta e o sábio chamam de coração.
Tu pela vida vás como as águas do rio
Regando indiferente as terras do sertão.
Os próprios colibris que, do vento ao cicio,
De jardim em jardim, o mel sugando vão,
Nas chamas, a girar, as falenas do estio,
Menos crueldade tem, mais volúveis não são.
Na forma escultural de teu corpo divino,
No brilho desse olhar que as almas estonteia,
Fulge todo o esplendor dum sonho peregrino.
Mas – que aparência vã! Nessa estátua sem vida,
Galatéa cruel por quem o artista ansia,
Não há calor’ não sofre uma alma comovida.
GODOFREDO DE OLIVEIRA RIBEIRO
“ O RIBEIRA DE IGUAPE “ –Prainha, 12 de Outubro de 1934 – ANO I – Num. 19
--------------------------------------------------------------------------
CORAÇÃO DE ANJO
(Resposta ao soneto “Sem coração” de Godofredo Ribeiro)
Eu sinto palpitar no peito não vazio
Isso que em nossa língua chamam coração.
Se pela vida vou como as águas do rio,
Vou risonha, bondosa, indiferente não!
Sou como o beija-flor que do vento ao cicio,
As flores dão carícias, enquanto os poetas vão
Falando mal da gente...Dizem de sangue frio,
Que nós, anjinhos bons, não temos coração!
Na forma bem pequena do coração divino,
E no brilho do olhar desta arma sem tormento,
Fulge todo esplendor dum sonho peregrino.
Mas não é só! Se movimento é vida,
Meu desditoso Eurico, eu tenho movimento,
Sinto do amor o sol nesta alma comovida!
Xiririca, 22 de outubro de 1934
BENJAMIN CONSTANT DE ALMEIDA NETTO
“ O RIBEIRA DE IGUAPE “ – Prainha, 15 de novembro de 1934 –ANO I – Num. 21
SONETO QUEBRADO
(feito por um “louco” que leu: “Sem coração” de G. Ribeiro e “Coração de Anjo” de Benjamin, of. A srta. Yvone de Oliveira)
Um diz que sim. Outro que não
Vive e palpita no teu peito,
O alvo de cupido. Pobre coração,,,
- Que já ouviu sonho desfeito?...
E enquanto, esses loucos poetas vão
Brigando, coitados talvez por despeito,
Vão concluindo...E é a conclusão,
- Que alegra estes “loucos” satisfeitos.
Por isso pouco importa para mim;
Que amor seja deles o tormento,
- Ao ponto de julgarem-te assim?
O que quero e sonho aqui sozinho,
- E’ o que penso ao escrever neste momento,
Poder estar sempre de ti juntinho.
Batatal, 20 de novembro de 1934
INAIGYRA
“ O RIBEIRA DE IGUAPE “ – Prainha, 13 de janeiro de 1935 – ANO I – Num. 24
ROSAS
(Of. A Rosinha)
Rosas!... quantas rosas me enfeitaram o peito,
perfumando,
inebriando
O coração à grande amor afeito.
Quantas rosas delicadas, finas...
perfumosas,
graciosas,
Eu encontrei em meio do caminho
Da minha sonhadora juventude!
Quantas rosas que em linguagem muda
me faziam compreender
Que naquele perfume delicioso
Havia um não sei que
De misterioso!...
Quantas rosas encantadoras,
embriagadoras,
Eu beijei tão inocentemente
naquele tempo risonho
da minha infância inquieta!
Nos versos que componho
há fragmentos de sonho
e há perfume de rosas
que com amor beijei!...
Mas, uma Rosa única encontrei
durante a minha vida
que soubesse falar,
amar, seduzir, chorar,
sorrir, sonhar,
ouvir e compreender
a linguagem própria do meu ser...
E essa Rosa és tu, Linda Rosinha!...
São Paulo, 1933 - BENJAMIN C. ALMEIDA NETTO
“ O RIBEIRA DE IGUAPE “ – Prainha, 15 de novembro de 1934 – ANO I – Num. 21
ENCANTAMENTO
Num sonho brando, harmonioso e lento,
Minha alma voa com sutil voar,
Sobre esse amor qual uma flor ao vento,
Que foge ao colibri que vai beijar.
E vivo desejoso e cismarento,
Como a ave vagando pelo ar
Sobre o paramo extenso e nevoento
Em que não acha o ramo onde pousar.
Esse amor o conservo bem guardado,
Como um tesouro incógnito encantado,
Debaixo da mudez do meu cismar.
E só uma orvalhada prolongada
Desses teus olhos místicos de fada,
O poderá talvez desencantar.
Xiririca, Outubro de 1934
JOÃO RIBEIRO DE FREITAS
“ O RIBEIRA DE IGUAPE “ – Prainha, 13 de janeiro de 1935 – ANO I – Num. 24
SONETO A ALGUÉM
Eu já sabia amar quando nasceste...
Eras nenê, no seio da inocência,
Tinha nas asas ainda a cor celeste.
Quando findava a minha adolescência.
Aos seis anos, em ti reinava a essência
De uma futura ninfa, e assim cresceste,
Como a roseira em sua florescência,
Mostrando a formosura que trouxeste.
Depois da adolescência quase ainda...
E’s como a estrela mor de um firmamento,
Brilhando sobre toda a natureza.
Enquanto, com a existência és bela, finda,
Em balde uma esperança eu alimento,
De morrer nesses braços de princesa...
Xiririca, Outubro de 1934
JOÃO RIBEIRO DE FREITAS
“ O RIBEIRA DE IGUAPE “ – Prainha, 13 de janeiro de 1934 – ANO I – Num. 24
NÃO QUERO FICAR VELHO
(Ao vate xeririquense Domingos Bauer)
(Especial para “ O Ribeira de Iguape”)
Na primavera eu tomo a cor das flores,
Mas no inverno eu engelho,
A mocidade encerra mil amores!...
Não quero ficar velho!
Quero apenas viver na flor dos anos,
De fragrância sem par;
Não quero ver da vida os desenganos
E amarguras provar!
Quero sentir na flor da primavera
O aroma que me invade;
Quero viver num sonho de quimera
Sem ver a realidade!
Da quadra em que eu estou não quero dar
Um passo mais a frente;
Quero entre as flores do jardim ficar
Cantando alegremente!
Quão triste deve ser em horas dadas
Ficar assim velhinho!
Ver da existência as flores desfolhadas
Deixando só espinhos!
Na primavera eu tomo a cor das flores
Mas no inverno eu engelho;
A mocidade encerra mil amores,
Não quero ficar velho!
S.Paulo, 1932
BENJAMIN C. ALMEIDA NETTO
“ O RIBEIRA DE IGUAPE “ – Prainha, 15 de julho de
1934 – ANO I – Num. 13
MORRER . . .
( Ao inesquecível poeta xiririquense Benjamin C. Almeida Netto)
Morrer assim como morreste, Poeta,
Na alvorada do sonho e da esperança,
A sorrir e cantar
Na gôndola do amor que se balança
Como as ondas do mar,
Não é morrer, mas é partir mais cedo,
Antes do dia findar.
Morrer assim é a hora da partida
Abreviar.
E fundir-se na vida
Como nos seios da mulher amada,
Em seus lábios de fogo, em seus olhos de sonho.
No amor que faz a morte apetecida,
E faz da vida
A fuga para o nada.
Morrer assim em plena mocidade
E’ as glórias dos heróis, eleitos dos deuses.
Que não conhecem a velhice
A decadência, a dor,
Que vivem para o triunfo, para o amor.
Morrer assim é triunfar da morte
E vencer a matéria
E dominar a sorte
Em rumo audaz para a região etérea
Como as águias da praga americana,
Voando sobre as nuvens e as montanhas.
Morrer assim cantando a vida inteira,
Assim sempre a sorrir,
Morrer assim,
É triunfar da morte, a eternizar a vida.
Conquistando a suprema ventura,
Como tu, Benjamin.
Xiririca, 06-07-1935 – GODOFREDO RIBEIRO
“ O RIBEIRA DE IGUAPE “ – Prainha, 15 de setembro de 1935 - ANO II – Num. 40
CONFORMIDADE
Mulher bendita de meus olhos santos,
Mulher amada de meus sonhos loucos,
esses lauréis do mundo (eles são tantos!)
Junto a teus pés, são todos eles poucos!
E por isso eu, paupérrimo de bens
e mendigo de amor, me abato por
ver que tu, ó Mulher excelsa, vens
humildemente suplicar-me amor.
E nesse estado tanto me confundo
que, desejando ficar mudo.
Tu, que devias ser rainha do mundo,
a mim, que nada tenho, pedes tudo.
E eu, que não tenho nada pra te dar,
arrojo-me a teus pés extasiado
e me contendo com este minguado
prazer de loucamente te adorar.
X K W Y
“ O MUNICÍPIO “ – Prainha, 25 de janeiro de 1942
ANO II – Num. 6
MINHA NAMORADA
A beira da estrada.
Onde canta a passarada,
No verde da mata sagrada,
Na linda tarde sombreada
Do céu azul esmaltado descem harmonias de luz
No recanto quase...abandonado
Onde vivo feliz conformada...
As palmeiras berrantes
Enfeitam vales e montes,
Soberbas indiferentes
Quais peregrinas errantes...
Nas grutas barulhentas e frias,
Ao soprar das ventanias.
Ao chorar de agonia,
A água soluça e desaparece,
Como lágrima e hora de prece.
As árvores robustas frondosas,
Alvas de cetim serenadas,
Como princesas de conto de fadas.
Meu canteiro de saudades e violetas,
É sempre visitado
Pelo reino das borboletas,
De asas transparentes,
Corações multicores,
Trazendo mais primores,
Para a cabina secreta dos amores.
Minha vida é um astro de alegria,
Que incendeia na alma vazia
Luzes, melodias, esplendor,
Inscrições de romances de amor.
Esvoaçando sorriso,
Edificando no paraíso
Ninho de luz e harmonia.
É esta a minha morada cheia de quietude e encanto,
Ereta a beira da estrada
E onde, às vezes, também canto!
AURA MARI
Itaúna, 20 – 05 – 1942
“ O MUNICÍPIO “ – Prainha, 7 de setembro de 1942
ANO III – Num. 12
“NO LEITO”
Como tudo lá fora, brilha ao som do vento
Como se expande à mocidade em gargalhadas,
Na amplidão empoada, das manhãs rendadas
Pela neblina fina,
Imponente e insistente,
Onde um sol dourado beija lâminas prateadas
De lágrimas dos raios que a terra chora...
Melancolicamente – como a gente.
Chega-te para mim natureza querida!
Vem velar-me no leito, e prolongar-me a vida
Porque tanto suspiro!...
Vês? A febre sufoca-me, deliro...
Como se fosse meu amor primeiro,
Quero o teu beijo mudo verdadeiro...
Através dos meus olhos profundos e tristes,
Círculo sombreado, fonte abandonada,
Onde bebeu o sol o frescor da alvorada,
Verás vergônteas virgens amarelecidas.
Contornando um castelo de ilusões perdidas,
(Castelo humano, frágil testemunho!)
Que Deus edificou numa manhã de junho...
Visando arrebatar-me a flâmula – esperança
Que me acompanha quer na mágoa ou no prazer,
O destino cravou-me envenenada lança,
Fazendo-me pensar na morte...Se eu morrer
Jovem, assim, minha alma irrequieta e saudosa
Há de voltar à terra, ao mundo enganador
Porque a morte destrói a matéria orgulhosa,
Mas não extingue o Amor, que é eterno...
Porque é Amor!...
AURA MARI
Apiaí, junho de 1942
“ O MUNICÍPIO “ – Prainha, Nov/Dez de 1942
ANO III – Num. 13 e 14
“DESPEDIDA”
Apresento-te as minhas tristes despedidas...
Caminhando sobre abrolhos,
Levo lágrimas nos olhos
E, no peito, o coração ferido.
O nosso amor, nascido
A sombra de uma tradição,
Foi destruído pela tua ingratidão!
Levo também tuas cartas, teu retrato:
Relíquias que relembram o passado;
Porque tudo passou... Porque tudo acabou...
Seguiremos, agora, indiferentes,
Por diferentes caminhos.
Que, o teu seja só de flores,
Seja embora o meu, de espinhos.
Se algum dia, na curva longíqua da vida,
Encontrares uma mulher entristecida,
Não perguntes se ela amou,
Nem indagues se sofreu;
Que, nos seus olhos tristonhos
Lerás a história dos sonhos
Que vivestes e ela viveu
- Essa mulher...serei eu!
Itaúna, Março 1943
AURA MARI
“ O MUNICÍPIO “ – Prainha, 11 de abril de 1943
ANO III – Num. 17
PÁTRIA É UMA SÓ
(Impressões do enlace: Okuyama – Ydo.)
Típica a festa começa:
Musica e danças orientais.
A um lado, entre os comensais,
Velho nipon, sorridente,
Ouvia, como os demais,
De uma “Samisen” dolente,
Os surdos sons sempre iguais.
No olhar, desmentindo a boca,
Enquanto a boca sorria,
Uma outra expressão se via,
Que, se não era tristeza,
Também não era alegria.
Da Pátria à lembrança preza,
A alma é envolta em nostalgia...
Vão-se apagando os sorrisos.
Minha sensibilidade,
Filha da fraternidade,
Lê naquele coração,
Escrito pela saudade.
(A Pátria esquecer quem há de?)
Esta palavra: “Japão...”
Por isso, eu peço ajoelhado,
Meu Brasil - peço rezando,
Que Deus me conceda, quando
Tenha eu de ser castigado,
Do teu chão abençoado,
Não saia, vivo, chorando,
Mas fique, aqui, sepultado.
DOMINGOS BAUER LEITE
“ O MIRACATU “ 13 de janeiro de 1946
ANO II – Num. 54
“MIRACATU”
( Ao poeta de puro quilate, Domingos Bauer)
Serpeia caudaloso o São Lourenço,
Sem bulha, sem ruído, sem anseio!
Tranqüilo, o rio vai cortando em meio,
O fértil solo, produtivo, imenso!
Fitando assim tanta imponência, penso
tudo o que existe, de riqueza cheio!
tanta grandeza que o pequeno, creio,
evolui, toma vulto, me convenço!
“Terra de boa gente” que trabalha,
Que nos degraus do Progredir, não falha,
Crescer deseja sempre mais ainda!
Cantando embora sem lavor nem trilho,
Eu digo: Vem Amigo, ver o brilho,
Mira cá...Tu a Natureza linda!
29/10/47
MACHADO DE ABREU
(Delegado de Polícia)
“ O MIRACATU “ – Miracatu, 16 de novembro de 1946
ANO III – Num. 150
VAI!
Vai, sem temer a noite escura que vem vindo...
Meu pensamento audaz, que sempre te acompanha,
Acenderá no céu um plenilúnio lindo,
E pedirás também às virações lunares
Arranquem das hastes as flores da montanha
Para alfombrar o chão por onde caminhares!
Vai, sem temer a noite escura, expondo a alma...
Ai tu sentirás como se uma janela
Fechada, há muito tempo, ante a paisagem calma,
A voz do meu amor, de súbito, se abrisse,
E, alacre, o coração se debruçasse nela,
Vendo a realização de tudo quanto eu disse...
HEITOR MAURANO
“ O MIRACATU “ – 20 de julho de 1947 – ANO III
Num. 133
TEU SEGREDO
Quanta ilusão continha o teu olhar!
E que doçura essa ilusão continha!
Nunca pensei que estava a terminar
Tanta alegria para a vida minha...
Quando todas as tardes, ver-te, eu vinha,
Para minha ilusão alimentar,
Nem a menor suspeita em mente eu tinha,
E nem podia mesmo acreditar.
Que o nosso amor chegasse, assim tão cedo,
A ter um fim tão ríspido, cruel,
Cujo motivo está no teu segredo:
- Não quero mais viver libando o mel
que tem a nossa taça, eu tenho medo
que ele se acabe, e que só fique o fel...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 13 de julho de 1947 – ANO III
Num. 132
PAULO
(Dedicado ao Paulo de Castro Laragnoit)
O píparo jantar, um bom almoço,
A mesa cheia de iguaria fina!
Qualquer Vitelius pois gozar opina,
Com apetite e sem menor esforço!
Galinha a molho pardo, peixe frito,
O vaidoso peru, bem recheado!
Churrasco do rio Grande mal assado,
Carneiro, pato cheio ou um cabrito!
Tudo isso feito com capricho e arte,
O paladar mais exigente farte
De lauta mesa, s’ encontrando em torno!
O mais completo mestre de cozinha,
Peça licença ao de primeira linha,
Perito é o Paulo n” um arroz de forno!
TUCAMIRA
“ O MIRACATU “ – 29 de fevereiro de 1948
ANO IV – Num. 165
DEUS E A NATUREZA
Aos golpes de uma enxada se abre a terra,
Que se transforma em leito da semente;
O sol agonizante lá no poente,
Inda põe luz no cume de uma serra...
Na flor das águas a coroa erra;
Ao longo se ouve o tom, semidolente,
De um munjo que bate, renitente,
Na rígida madeira em que se encerra...
O nosso olhar se perde entre a beleza
De um céu todo estrelado, reluzente...
Quem não vê nesse quadro uma grandeza?
Pois nisso se percebe e mais se sente
Que se irradia, em toda a Natureza,
Todo o poder de Deus Onipotente!
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – Miracatu, 11 de Janeiro de 1948
ANO IV - Num. 158
O CEGO
Sentado junto à mesa da taberna,
Aconchegando ao peito o seu violão,
O cego canta, triste, uma canção,
Numa toada dolente, que consterna...
E sob a luz que escapa da lanterna,
Que bruxoleante morre pelo chão,
Ele maldiz a eterna escuridão
Cantando a turba a sua dor interna...
Quando a última nota aos céus eleva
Estende a esmo a mão pálida e fria,
Em busca de uma dádiva, uma esmola...
Triste consolo dá-lhe a nostalgia:
A dor que lhe sai d’alma e às trevas rola
Produz-lhe, enfim, o pão de cada dia...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 11 de janeiro de 1948 – ANO IV
Num. 158
FIM DE ANO
Trezentos e sessenta e cinco dias...
Um ano a mais se passa, e a vida voa;
Vão-se horas de tristezas, de alegrias;
O tempo é inexorável, não perdoa...
Anda o relógio... Tudo se esboroa,
Em lentas, prolongadas agonias...
E com o tempo, andando, assim, à toa,
Vão-se os prazeres de horas fugidias...
Eu olho o calendário: é já Dezembro;
Um ano a mais de luta e de esperança...
-De prazeres também? Eu não me lembro...
Vencendo a Vida, assim, aos solavancos,
Dela eu vou tendo, pálida lembrança,
Que se ressalta em meus cabelos brancos...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 4 de janeiro de 1948 – ANO IV
Num. 157
AS 3 PORTAS
O Cartório de Paz, desta cidade,
Que tem Domingos Bauer na chefia!
Mudou-se d”onde esta n”outro dia,
Parece coisa chã, sem novidade!
Cantando, entanto, eu vejo, na verdade,
Algo tocando a sã filosofia!
Nessa mudança, uma lição sadia,
Lição que ao pensamento meu, m”invade!
Nas três portas do prédio, o ensinamento,
Vejo a lição com segurança, atento,
Lição que ninguém nega o quanto é forte!
Qual prédio do Cartório, a nossa vida,
Por 3 portas também é guarnecido:
O nascimento, o casamento e a morte!
MACHADO ABREU
“ O MIRACATU “ – 08 de fevereiro de 1948
ANO IV – Num. 162
NÃO TENHAS MEDO
(Ao gentil medroso, o valente: TÉO BALDO).
O machado que tanto t”amedronta,
Que t”apavora e muito medo faz!
É sem gume, é sem fio, não t’afronta,
E nessas condições é incapaz!
Camadas de ferrugem não tem conta,
Dos anos, sob o peso, em doce paz!
Consigo apenas ele agora traz
Essa fraqueza que a Velhice aponta!
Com todo esforço seu, mostra aos domingos
Débil trabalho, um “nada”, só respingos,
Sem eco, sem valor e sem ter voz!
Da Mocidade, já perdeu o afoite,
A vida, embora dia, é sempre noite,
Não tenhas medo de machado, pois!
9-2-48 MACHADO ABREU
“ O MIRACATU “ – 15 de fevereiro de 1948
ANO IV - Num. 163
OS DOIS VULTOS
Na sombra imensa de uma noite escura
Pergunta um vulto ao outro em voz passada:
- “Quem és e que tu buscas criatura?”
“Que fazes tu no meio desta estrada?”...
- “O Amor eu sou, e acho-me à procura
De quem comigo encete uma jornada;
De quem me traga um pouco de ternura;
De quem me torne suave a caminhada...”
- “E eu o Ciúme sou...Muito cansado,
A fim de completar sonhos ideais,
Procuro um companheiro, eterno aliado...”
E assim dizendo, os vultos, fraternais,
Saíram pela sombra, lado a lado,
E não se abandonaram nunca mais!...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 27 de abril de 1947 – ANO III
Num. 121
PRIMEIRO ENCONTRO
Cheguei...Sorriste...Olhei nos olhos teus;
A luz do teu olhar me confundia...
Embaracei-me...Fui dizer-te adeus!
Peguei-te a mão...Meu Deus! Como era fria!
Medrosamente olhaste aos olhos meus;
Estranha a sensação que me invadia...
Ficaste então nervosa...Eu sei...Meu Deus!
Depois...Depois...Nem sei o que eu sentia!
Eu quis voltar...Tentei...Ia fugindo...
Ia sair assim timidamente,
Mas vi de novo o teu olhar...Tão lindo!
Então fiquei...Fiquei, e foi somente
Quando notei o amor em ti florindo...
Peguei-te a mão...Meu Deus! Como era quente!...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 08 de junho de 1947 – ANO III
Num. 127
O PALHAÇO
Sai ao palco o palhaço... O povo grita;
Intensa é a gritaria... Intensa e louca!
A garotada freme e fica rouca!
E toda a multidão ali se agita...
Ele apenas procura abrir a boca
E a platéia gargalha... Ele se irrita
Mas ri também... E a gente toda o imita;
É o riso da inconsciência que se espouca...
Somente quer falar do seu desgosto,
Um sofrimento íntimo que tem,
Mas não consegue... Volta... Sai do posto...
Tenta falar... De novo ao palco vem,
E quando enxuga as lágrimas do rosto
Novos brados se rompem: “Muito bem!”
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ - 29 de junho de 1947 – ANO III
Num. 130
TUA DESCRENÇA
Tenho vontade de dizer-te tudo
O que minh’alma agora está sentindo;
Mas não devo fazê-lo, eu não me iludo,
Dirias, estou certo: “ Estão mentindo...”
É preferível conservar-me mudo,
Num silencio brutal, maldito, infindo,
Do que se expor o meu sofrer agudo
E ficares, depois, de mim sorrindo...
Nunca soubeste o quanto eu te quero;
Não há no mundo o que te faça crer
Na intensidade deste amor sincero...
E se eu te faço ver minhas desditas
Então só recrudesce o meu sofrer,
Porque zombas de mim, não acreditas...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 27 de julho de 1947
ANO III – Num. 134
NO ROSEIRAL
Naquela tarde tão serena e fria,
Quando eu a vi, no roseiral em flores,
Eu me extasiei, queimando-me em rubores,
Ao ver que a mim, medrosa, ela sorria...
Já na tarde seguinte eu percebia
Que me incendiava pelos seus amores;
E assim busquei revê-la, entre temores,
Seguidas tardes, quando o sol morria...
Inúteis meus esforços... Meus tormentos
Cresciam mais e mais, pela ansiedade,
De serem satisfeitos meus intentos...
Sentindo as minhas mágoas de saudade,
Parece que as roseiras, em lamentos,
Mostrava-me um sorriso de piedade...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 10 de agosto de 1947 – ANO III
Num. 136
INGÊNUA
A princípio eu passava, ela sorria;
Detinha-me depois, ela falava...
Mais tarde à sua frente eu me postava
] E palavras de amor lhe dirigia...
De momento a momento eu mais sentia
Uma forte impressão que ela me amava...
- Será que ela sabia o que eu pensava?
- Do meu imenso amor ela sabia?
Um dia, na mais santa das paixões,
Cujo ardor eu dizer não mais consigo,
Propus-lhe unirmos, num, dois corações...
Ingênua ela se fez – bem triste digo...
Tirando-me do peito as ilusões
Somente perguntou: “ faltas comigo?...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 17 de agosto de 1947
NO III – Num. 137
DEVANEIOS
Quando a pensar em nosso amor me ponho
No silêncio bendito de horas mortas,
Sentindo que ao meu lado te transportas
Meu pensamento se redunda em sonho...
Mil madrigais em teu louvor componho;
Infindas mágoas minhas tu confortas;
Aos céus ascendo, e lá chegando, às portas,
Sem transpô-las desperto, ainda risonho...
Eis-me de novo no meu quarto pobre,
Onde contigo os sonhos meus reparto
Nas horas mortas de um sonhar tão nobre...
E em meio ao tédio que me põe tão farto
Tua visão minh’alma ainda descobre
Bailando pelas trevas de teu quarto.
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 24 de agosto de 1947 ANO III
Num. 138
A PAINEIRA
Na primavera foi, que numa estrada,
Eu conheci esta árvore formosa,
Que embora pelos homens nunca amada
Libava belos sonhos cor de rosa...
Toda cheia de flores! Perfumes!
E nunca fôra um dia visitada...
Simples e bela, rica e esplendorosa,
Porque vivia assim tão desprezada?
Em poucos anos que eu fiquei ausente,
Sem a paineira amiga visitar,
Fi-la tornar-se triste, descontente...
Na derradeira vez que lá voltei
A fim de suas flores contemplar,
Apenas o seu tronco eu encontrei...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 7 de setembro de 1947 – ANO III
Num. 140
OS ESTUDANTES
Ao ver passar um grupo de estudantes
Nessa alegria moça e contagiosa,
Sinto saudades dos meus tempos dantes,
Daqueles belos tempos cor de rosa!
Nos lábios os sorrisos incessantes;
No coração a fé mais ardorosa;
Vivíamos assim muito distantes
De perceber que a vida é tão maldosa.
Hoje há nos lábios um sorriso triste;
Ouve-se atrás o eco da saudade
Nos relembrando o que não mais existe...
- Meu frouxo raio de felicidade,
Em ver o teu desfile, hoje consiste,
E eu te saúdo, pois, ó Mocidade!
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 14 de setembro de 1947 = ANO III
Num. 141
SAUDADE
Essa saudade que inspira
Que faz sofrer quem quer bem,
Essa saudade – é mentira!
Ela não mata ninguém...
Pela saudade, também
O poeta às vezes delira...
Uma saudade de alguém
Quem é que nunca sentira?...
Razão não tem quem exclama:
- “De saudade estou perdido!”
- “Do seu fogo eu sinto a chama!”
Quanta que eu tenho sentido!
Se ela matasse quem ama
Eu já teria morrido...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 05 de outubro de 1947
ANO III – Num. 144
PELO NATAL
Quando eu me lembro que já fui criança,
Que fiz cartinhas a Papai Noel,
Sinto-me invadir um pouco da esperança
Que havia nos meus barcos de papel...
Mas quanto mais na vida a gente avança,
E vê, bem mais de perto o seu painel,
Nos vem um pensamento: tudo cansa...
Em tudo existe agrura, existe fel...
- “Meu bom Papai Noel, tu me conheces!”
Todo constrito eu rezo as minhas preces
Nas noites de Natal, pensando em ti...
Já não te peço mais nenhum brinquedo;
Papai Noel escuta o meu segredo:
“Faça voltar-me a infância que eu vivi!...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 12 de outubro de 1947 –
ANO III – Num. 115
OUTONO DA VIDA
O sol já vai morrendo...A noite desce...
Nas trevas meus martírios vão crescendo...
Ao ver que os sonhos meus vão fenecendo
Eu ergo aos céus, contrito, a minha prece...
Uma visão, risonha, me aparece!...
Imagem misteriosa! Eu não a entendo...
Se eu procuro falar-lhe sai correndo,
E foge sem me ouvir...Não me conhece!
Em mágoa põe-me sempre essa visão!
Parece ter o gérmen da maldade
Com que me vem ferir o coração...
Ao pôr-se em fuga, diz-me com vaidade
- “ Não queiras me deter...Não vês, então,
Que em mim se espelha, em riso, a Mocidade?”
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 19 de outubro de 1947 – ANO III
Num. 146
O PASSADO
O passado...O passado...Que ironia!...
Não pode ser passado o que é presente...
Eu tenho ainda o nosso amor em mente;
Ele é passado, e sinto-o noite e dia...
As tuas juras, cheias de poesia
Que sempre me deixavam tão contente,
Inda hoje as ouço, dolorosamente,
Sentindo n’alma entrar a nostalgia...
O passado! O passado! O que pé passado?
Recordações da vida...É o que eu entendo...
Recordações – talvez de um bem amado
E se o passado é tudo o que estou vendo
E tudo quanto eu tenho recordado,
Apenas do passado estou vivendo...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 26 de outubro de 1947 – ANO III
Num. 147
TÉDIO
A chuva cai, monótona e sem fim,
Como se fôra a Natureza em pranto;
Nas flores ela esparge seu quebranto,
E dá mais vida – intensa – ao meu jardim.
Eu seismo na janela...Seismo, e assim
Percebo vir-me a dor do desencanto
Que me restou do nosso amor tão santo,
Posando eternamente sobre mim...
E olhando a chuva eu sinto, entre amargura,
Recordações cruéis de um desenlace
Que aos poucos me carrega à sepultura...
Como se a chuva inveja lhes causar-se,
Os olhos meus, mostrando um mal sem cura,
Vão derramando lágrima na face...
NEVES RIBEIRO
“ O MIRACATU “ – 02 de novembro de 1947
ANO III – Num. 148
O MUNDO A SÉCULO XX
Vejo, diante de mim, o mundo extasiado,
Na abundância do mal, na carência do Bem:
Assoberba-lhe o crime e por isso o pecado
Não impressiona mais nem faz mal a ninguém.
Se Deus voltasse à terra, um dia, disfarçado,
- Ele que tudo pode. Ele que tudo tem,-
Havia de ficar, por certo, contristado
Da miséria do mal que há pelo mundo além.
Onde Ele encontraria o Amor, a Caridade,
A Justiça, a Clemência, o Perdão, a Bondade,
E a Fé, como farol, ao menos nesse dia?
Havia de encontrar, entre mágoa e surpresa,
Arrojado na lama o manto da Nobreza,
E o caráter vencido aos pés da hipocrisia.
Xiririca, 1931 – DOMINGOS BAUER LEITE
“ O MIRACATU “ – 11 de agosto de 1946
ANO II – Num. 81
OLHOS . . .
Olhos negros e profundos,
Dois oceanos, dois mundos,
Dois abismos informais.
Quem os vê fica perdido,
Entre tonto e comovido,
E não os esquece mais!
Na vida dos infelizes
Deita a desdita raízes
Através de algum olhar.
Muita gente sabe disso...
Dá-lhe este nome: - Feitiço!
E acha um consolo – chorar!
Miracatu, julho de 1946
DOMINGOS BAUER LEITE
“ O MIRACATU “ – 28 de julho de 1946
ANO II – Num. 82
VISÕES INESQUECIDAS
Quando, passeando, passo, pensativo,
Pelas ruas rendadas de luar,
Levo no peito um pássaro cativo
Desesperado de poder voar.
A velha dor procura um lenitivo,
Sabendo que é melhor não o encontrar...
Que o sofrimento é o mágico incentivo
Para que quer as musas cultivar!
Meu pensamento, em largas avenidas,
Faz desfilar visões inesquecidas
Que ainda povoam minha inspiração!
Da vida, nesta altura do caminho,
Fiz-me prisão e algoz: - é o passarinho
Desesperado e escravo - é o coração!
DOMINGOS BAUER LEITE
“ O MIRACATU “ – 8 de julho de 1945
ANO I – Num. 27
O PRÊMIO DA RENÚNCIA
Antes do carnaval, quantos preparativos!
Quanto sonho pueril, próprio do adolescente!
Mas como há corações santamente cativos,
O sonho se desfez melancolicamente...
Durante o carnaval, nos momentos festivos,
Punha-se a meditar a donzela obediente: -
“ Prometeu; não iria aos brinquedos nocivos”...
Embora renunciasse involuntariamente.
Depois do carnaval, em paz com a consciência,
Bendizia, feliz, o ensejo da experiência
Em que pusera à prova a sua juventude!
Vai longe o carnaval. Meses são decorridos,
Quantos se lembram dele, agora, arrependidos!
Enquanto ela cultiva as flores da Virtude.
Prainha, 1944
DOMINGOS BAUER LEITE
“ O MIRACATU “ – 04 de novembro de 1945
ANO I – Num. 44
MANHÃ
Por mais que eu tente, num sorriso vago,
Iludir, iludindo-me também,
Quando (comigo intimamente o trago)
Seu nome é pronunciado por alguém...
Do olhar e da lembrança não apago
A luz que as letras do seu nome tem,
- Luz que me faz um benfazejo afago!
Milagre que transforma o Mal no Bem!
Por mais que eu tente, sim, ia dizendo,
Esquece-la ou fingir sequer que a esqueço,
Não posso, não consigo... E não me ofendo.
Se alguém, por isso achar que sou covarde:
Tê-la, -é compensação que não tem preço!
Linda manhã dentro da minha tarde!
DOMINGOS BAUER LEITE
“ O MIRACATU “ – 30 de setembro de 1945
ANO I – Num. 39
P O E M A D A D O R
(Lembrando a “sinfonia dos gemidos” do Sanatório
São Lucas, da Capital.)
Quando a dor nos bate à porta
E vem conosco morar,
O que menos nos conforta
É sem dúvida chorar...
Mas a dor tem leis terríveis,
Eternas, irrecorríveis,
Contra as quais nada podemos,
Por isso, o que mais fazemos
Quando a dor nos bate à porta
E vem conosco morar,
(Sorrindo quem a suporta?)
É sem dúvida chorar...
DOMINGOS BAUER LEITE
“ O MIRACATU “ – 01 de julho de 1945
ANO I – Num. 26
A S A R A P O N G A S
(Na fazenda Jaguarí)
É interessante quando uma araponga
Pousa altaneira a um galho e o bico alonga,
Batendo na bigorna,
Dentro da tarde morna: -
Tem...tem...tem...
Cessam, na mata, todos os ruídos!
E as marteladas vêm ferir nossos ouvidos,
Ferindo o nosso coração também.
Mas eis que outra araponga caridosa
- Como ao lado do espinho nasce a rosa –
Completa, sem alarde,
O concerto da tarde:
Rem...rem...rem...
E o som das suas limas benfazejas
É um bálsamo que cai nas almas sertanejas,
Caindo em nossos corações também.
DOMINGOS BAUER LEITE
“ O MIRACATU “ – 25 de fevereiro de 1945
ANO I – Num. 8
TOTÓ
Quem foi, quem é Totó? É um Cristo, um João Batista,
Um Job, um Pedro-Cinza... Um bem-aventurado
Cujo leme da nau do Destino partiu-se!
Foi um moço feliz, estudioso, idealista:
De sonhos e ilusões transborda o seu passado!...
Mas certo dia, triste e estranhamente, viu-se
Obrigado a enfrentar, sózinho, o vento mau
Que lhe arrancou das mãos a direção da nau.
Como quem tem a cena, estampada no olhar
Que desde então secou! Não sabe mais chorar...
Nunca pôde alcançar a quiméra querida,
Nem regressar, tão pouco, ao ponto de partida,
Para sonhar, de novo, ao menos um momento.
Lutou como um herói contra as ondas e o vento
E, vencido, ficou, no mar, flutuando, ao léu,
Sem recriminações, sem queixa, sem lamento.
Todo o gesto que esboça, é um passo para o ceu...
(Evita descrever a sua história triste.
Mas, às vezes, se trai e dá a entender que existe
Na sua mocidade, já longíqua e aflita,
Indefectivelmente, uma mulher bonita...)
Quem foi, que é Totó? Foi a Esperança! E é isto:
Um Pedro-Cinza, um Job, um João Batista, um Cristo!
Domingos Bauer Leite
“ O MIRACATU” – Domingo, 28 de outubro de 1945
ANO I – NUM. 43
CORAÇÃO SEM DONO
Andávamos os dois, - a Primavera e o Outono,
(Era tardinha já, quase hora do sol-posto)
Por caminhos, como eu, tristes, em abandono,
Quando, não sei porque, fitando-te no rosto.
E às palavras vestindo um lisongeiro entorno
Como para evitar-te o mínimo desgosto,
Três vezes perguntei: “Teu coração tem dono?...”
E um punhal, na tua voz, nunca por mim suposto.
Dos teus lábios saiu, em forma de um sorriso,
Estranho, diferente, irônico, impreciso,
Pondo-me triste, mudo, imóvel, contrafeito.
Mas tendo em meu olhar aquela angustia da alma
Disseste-me: “ Não tem. Mas recupera a calma:-
Teu verso é o bisturi. Arranca-me-o do peito!...”
DOMINGOS BAUER LEITE
“ O MIRACATU “ – 11 de fevereiro de 1945
ANO I – NUM. 6
DE REGRESSO
Além, na estrada, vem o pobre velhinho,
Envolto na poeira da jornada...
Foi buscar flores e só traz espinhos;
Por isso, vem chorando, além, da estrada...
Alma inspirada, via lindos caminhos
Na vida ainda em plena madrugada!...
Partiu, - deixando o lar e seus carinhos,-
Para o mundo do Sonho: Alma inspirada!
Foi com o Riso e com a Mocidade,
Conhecer dos Amores a cidade;
E lá deixou a Mocidade e o Riso...
Se vem depressa, não é por ser forte:
- Foge da Dor e quer passar a Morte
Para viver além, - no Paraíso!...
Xiririca, 1927
DOMINGOS BAUER LEITE
“ O MIRACATU” – 26 de janeiro de 1947
ANO III – NUM. 108
R E N Ú N C I A
Meu pensamento corre, impertinentemente,
Pelos fios sutis de luz da tua lembrança,
Imitando, nas trevas, uma estrela cadente
Pelo espaço a guiar minha verde esperança.
Peraltice banal, travessura inocente,
Maluquice que vem dos tempos de criança,
Quanta dor de cabeça e mágoa traz a gente
A encantadora visão que a mão ainda alcança.
E, alcançando-a, procura, apenas, distanciá-la...
Nestes versos que escrevo, é minha alma que fala:
-“Segue tua linda estrada enquanto que eu regresso,
Por veredas nas quais seria impossível
Conduzir tua beleza imune, inatingível...
Pelo bem que te quero, é tudo o que te peço.
II
Que me torne infeliz, por isso, pouco importa;
Pois, só por te querer cheguei a ser alguém...
Tu, que vivificaste esta alma quase morta,
Sabes que, além de ti, eu nunca amei ninguém:
Nunca meu coração bateu de porta em porta
Mendingando carinho, ou em busca de quem
Repartisse comigo, em linha reta ou torta,
Um afeto fingido, um velado desdém.
Alpinista do Amor, só o concebo elevado,
Espontâneo, sublime, endêmico, inspirado
Na Beleza e no Bem, - todo feito de luz!
Por te querer demais, de um modo extraordinário,
Hei de ter, quero ter algozes e calvário
Fazendo da Renúncia a minha Santa Cruz...
Prainha, agosto de 1943 – DOMINGOS B.LEITE
“ O MUNICÍPIO “ – Prainha, 15 de agosto de 1943
ANO IV – NUM. 1
CANTIGA DE CABOCLO
SILVA ANDRADE ( Zé da Luz )
Os teus beiço feiticero; Quando os galo amiudando,
na tua bôca incarnada, cantava sarvando a orora,
é uma fruita de cardero, a isperança saluçando,
quando, ella nace alejada! Se dispidiu foi ce imbora!
Eu parece qui to vendo, Pra omenta o meu martyro,
Nos teus óio piquinino, tu tem nos beiço incarnádo,
Dois vagalume acendendo amarrado n’um suspiro,
Na noite de meu distino! Um bejo dipindurado!
Cabôca dos óio grande, Um bejo sim! Deverdade!
Vou fazê dos óio meu, Um bejo munto insolente,
Dos canequinho de frande qui as vez eu tenho vontade,
Pra bêbê água dos teu!... de arranca ele cum os dente!
Cabôca, tu tem na testa, Mais seu eu fizesse isso,
Tu tem na testa, cabôca, tu de raiva dava nó,
Dois cachorro da mulesta, tu me butava feitiço,
Qui me morde sem tê boca!... me butava catimbó!...
A pretura dos teus óio, Teus bejo mata, cabôca
Na brancura dos teu rosto, teus bejo mata, muié!
Na minh’arma dexa um móio tu tem veneno na boca,
De amargura e de disgosto! Cumo cobra cascavé!
Quando a cidade drumia,
Minh’arma tava acordada,
De prontidão, de vigia,
Na porta da minha amada!
O vento frio da noite,
Correndo, dando pinote,
No meo rosto dava açoite,
Qui só ponta de chicote!
O RIBEIRA DE IGUAPE – 25 de janeiro de 1935
ANO I – Num. 25
ALVI-CELESTE
Azul...
Azul e branco...
O céu manchado de nuvens,
As nuvens manchadas de céu!...
Azul...
Azul e branco...
O mar cheio de vagas,
As vagas cheias de espuma,
As espumas cheias de mar!...
Azul...
Azul e branco...
Sonho cheio de ilusões,
Ilusões cheias de saudades,
Saudades cheias de sonhos!...
Azul...
Azul e branco...
No branco da saudade, o amor,
No azul do amor, a Saudade.
Azul...
Azul e branco...
Amor...
Amor e saudade.
Prainha, abril de 1943 X K W Y
“ O MUNICIPIO “ Prainha, 11 de abril de 1943
ANO III – NUM. 17
QUANDO O POETA FICAR VELHO (À Godofredo, o poeta solitário)
Quando o poeta ficar velho
E ficar bem longe a mocidade,
Um dia...(Como será triste esse dia!)
Quando, ele, do sol não mais ver a claridade,
Oh, por certo, sentirá nostalgia.
Um dia, quando desabrochar a tristeza
E a realidade matar as ilusões,
Despetalar-se-ão as flores da beleza
E nascerão recordações...
O grande amor que ele construiu outrora
Nas suas estrofes de ouro,
- Como se constrói um castelo no ar -
Morrerá também, - que crueldade!
Só não morrerá seu nome, - que esse é grande!
Só não morrerá o seu verso, - que esse é eterno!
Quando o poeta ficar velho.
Se lembrará do bem que a todos fez.
- Os sonhos que espalhou!
- As desilusões que colheu!
Sua lira quebrada, a um canto.
Gemerá um canto de saudade.
E o poeta será feliz
Porque amou, porque viveu,
Porque chorou, porque sofreu,
Porque cantou.
§
Xiririca, 8-7-42 - João Mendes Silva
“ O MIRACATU “ – Prainha, 2 de agosto de 1942
ANO II – Num. 11
“Uma recordação de São Carlos, cidade que me
acolheu durante 8 anos. Lá eu concluí meus
estudos.” Paulo C. Laragnoit
“Passado”
”Passado...
O dia de hoje,
quando o amanhecer chegar
O momento desejado
que passa e que nos foge,
para nunca mais voltar.
Página, volvida do Livro da Vida,
lembrada ou esquecida.
Uma estrada,
uma, solitária, abandonada
Um tronco denegrido,
que sobreviveu entristecido
ao furor da queimada.
Passado!
Traço feito na terra, rastejando, ao léo...
ou esteira de luz,
que nos ajuda a subir,
subir
rumo ao Céu”!
Eulália Borges de Oliveira – São Carlos – SP.
“Ao amigo: Paulo de Castro Laragnoit”
D I N H E I R O
Dinheiro, velho dinheiro, Também o infeliz mendigo
Tu corres no mundo inteiro Que às vezes não tem abrigo,
E o mundo inteiro te quer! Nem leito para repousar;
És macio como arminho, Sabe que é um triste refugo,
E o homem te faz carinho Mas vive preso ao teu jugo,
Como se fosses mulher!... E a luta para te ganhar.
O pobre quando te pilha, Dinheiro, que eu mais diria!
Que sonho, que maravilha, Causas bastante alegria
Parece rico ficar... E muita desilusão.
Mas foges da mão do pobre Deixas os homens aflitos,
Que finalmente descobre Tens vários nomes bonitos,
Que tem mesmo é que sonhar!... Entre eles, São Cifrão.
Nas mãos do rico bondoso Da mulher falando agora
Tu ficas mais poderoso A verdade não demora
Porque o bem sempre reluz! Nem eu dela me esqueci.
Nas mãos do rico avarento É meiga e nos enternece,
Tu não passas de um tormento, Mas muita coisa ela esquece
E a vida é um fardo, uma cruz. Pra correr atrás de ti.
Falando do remediado Este é o meu ponto de vista,
Cujo gasto é controlado, Que também vou à conquista
Esse não tem que pensar. Do teu tremendo poder;
Nunca lhe falta a camisa, És o rei mais disputado,
Ganha e gasta o que precisa E é claro, sem teu reinado,
Sem sobras para esbanjar. Ninguém consegue viver.
Até mesmo a criancinha,
Essa jóia inocentinha
Que a gente quer tanto bem,
Não fala, não sabe nada,
Mas ao ver-te dá risada,
Pois te conhece também.
“Manoel Martins Dias”
Poeta de São Carlos, proprietário de uma livraria, era estimado e
respeitado na cidade “Sorriso”.
AH! SE TODOS SOUBESSEM AMAR ASSIM!
No ano setenta nós o conhecemos.
Fomos a sua casa visitá-lo e para vermos,
Relíquias preciosas de uma família de valor.
Sr. Pedro Laragnoit, de Miracatu, o fundador.
Ficamos encantados com tanta beleza,
Hospitalidade, conhecimento e gentileza!
Ganhamos a “História da Vila de Prainha”.
Rica, interessante, grandiosa _ Uma Prainha!
Paulo de C.Laragnoit, autor da “História” da cidade.
Documentada, humana, abrangente e com fidelidade,
Retratando o passado cheio de glória, tradições...
De gente generosa e digna de verdade.
Sentimo-nos comovidos, foi um privilégio!
Temos acesso à tanta cultura e a tanto amor...
Dali em diante, tudo valia muito mais!
Acreditamos num futuro brilhante e promissor.
Como não ter fé e esperança na cidade
Que nasceu em berço de ouro e bondade?
Parabéns , Sr. Paulinho, autêntico pesquisador,
Artista plástico, professor, historiador...
Ah! Se todos soubessem amar assim!
Contando a história do torrão e seus heróis homenagear,
A fim de seu povo sempre se orgulhar,
De sua gente valorosa que sofreu, lutou, amou enfim.
Depois conhecemos sua esposa Dª Marina Natal.
Professora, inteligente, criativa, bonita...
Sempre pronta a ajudar – Muito legal!
Requisitada nas festas, decoradora – Uma artista!
Ao querido casal que muito admiramos.
Felizes e longos dias desejamos.
Abençoados por Deus e bem iluminados.
Com saúde, paz e muitas alegrias!
Jará, 13/07/1993 Maria Ignez Pettená e Luiz Hélio.
”Para os amigos D. Marina e Sr Paulinho, estes simples versos, tentando externar nossa gratidão pela oferenda que nos deram – a linda tela a óleo da “Miracatu Antiga”. Agradecemos de todo coração, o valioso e significativo presente.”’
Estrela
Singela
Luzeiro
Fagueiro
Explêndido orbe que o mundo aclarais!
Desertos e mares, florestas vivazes
Montanhas audazes, que o céu rastejais!
Abismo
Sombrios
Cavernas
Eternas
Extensos
Imensos
Espaços
Celestes
Altares e tronos, humildes e grandes,
Curvai-vos ao culto sublime da Cruz!
Só ela nos mostra da glória o caminho,
Só ela nos fala das leis de Jesus!
F. VARELLA
Cidade DE XIRIRICA – Xiririca, Domingo, 20 de outubro de 1901 - ANNO I - Num. 27
De Pedro de Toledo a Itariri...
Foram quatro as palavras que ela disse,
quatro as palavras que eu lhe respondi,
Quatro gotas de sangue que saísse
ao golpe do punhal da despedida.
De nossos corações cada batida
Ouviu-se de Registro a S. Vicente
E foi ressoar no oceano tristemente;
e volvendo até o Vale do Ribeira
cobriu de espessa mágoa a zona inteira
Tudo, tudo vibrou com nossos ais!
O trem...o mar...a serra...os bananais!
Enlutou, nossa trágica odisséia,
Miracatu, Iguape e Cananéia.
Foram quatro as palavras que ela disse,
Quatro foram aquelas que eu lhe disse,
A causa de tantos ais,
A causa de tanta dor,
Chorando ela falou: “Não nos veremos mais!”
Suspiroso, eu falei: “Adeus, meu grande amor!”
HILÁRIO CORREIA
“O MIRACATU” - Domingo, 6 de novembro de 1950
ANO VI – Num. 303
OBRA SEM TÍTULO: PUBLICADO NAS PÁGINAS SOCIAIS DE “O MUNICÍPIO” – Por: S.S. e A.S.G.R. – Prainha 28/09/1941 – ANO II – nº 41
Alta noite... A lua, princesa altaneira, brinca no espaço
límpido e diáfano. Lá em baixo, o rio chora monótona-
mente enquanto em suas águas agitadiças, o luar põe
arabescos de prata. No silêncio de minha alma desola-
da e sozinha, os raios da lua, filtrados através da vidra-
ça, abrem estrias de luz por onde segue meu pensa-
mento cansado de insônia, abatido de amor, ralado de
saudade e enfermo de recordações. Tudo cilente...E
nesta paz docemente calma em que meu espírito pare-
ce embalar-se, brota, despertando uma tropel de lem-
brancas em meu interior meditativo, uma voz vigorosa
e jovem, entoando, acompanhada de instrumentos afi-
nados e chorosos, uma valsa que toca fundo meu cora-
cão, fazendo minha alma suspirar. Enquanto eu sonho
de olhos abertos correndo atrás de uma fantasia louca,
lá fora ecoa a voz do cantor:
I
Certa noite, em Prainha,
Tive uma recordação.
Vendo a lua brilhar,
Nosso amor recordei;
Em você muito pensei,
Estando quase a sonhar!
Lua branca, altaneira,
brilha sempre feiticeira
Com imaculado alvor!
Dá-me uma inspiração
nesta minha solidão
Em que sofro de amor.
II
Oh! Deus bondoso, ajudai-me!
Com esta lua, inspirai-me
Nesta minha pretensão de um fraco e triste trovador!
Com meu violão, eu choro
E humildemente imploro
Conseguir dela o amor!
Serei feliz, por toda a vida,
Junto de minha escolhida,
Daquela que em meu pensamento tinha,
Eu deixei meu violão,
Pra ela, em recordação, .
Numa noite em Prainha.
(RESGATE DE POESIAS / PESQUISA REALIZADA POR LAERTE BALTAZAR DE ARAÚJO)
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário